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"Não foi uma fatalidade", diz jornalista oeirense que sobreviveu a acidente que matou dois amigos

Jader Damasceno. Foto: G1

 Jader Damasceno. Foto: G1

Em tratamento para não perder a visão do olho e a audição, ambos do lado direito, além de recuperar o movimento facial, o jornalista e artista plástico Jader Damasceno conversou sobre as suas dificuldades, superação e projetos após um ano da tragédia que o deixou com sequelas. O jovem foi o único sobrevivente do acidente de trânsito que matou os irmãos Bruno Queiroz e Júnior Araújo, integrantes do coletivo cultural Salve Rainha.

Em 26 de junho de 2016, o carro em que ele e os irmãos estavam foi colidido por um outro veículo no cruzamento da Avenida Miguel Rosa com a Rua Jacob Almendra, no Centro de Teresina. O jovem Bruno Queiroz morreu no local e o irmão dele, Júnior Araújo, teve morte encefálica decretada quatro dias depois. Segundo denúncia do Ministério Público, o acidente foi provocado pelo motorista Moaci Moura, que dirigia em alta velocidade, estava alcoolizado e invadiu o sinal vermelho. O processo deve seguir para júri popular, mas sem data prevista.

"Eu não escolhi estar aqui com minhas limitações, minha crise de pânico, com o meu olho, ouvido, fala comprometidos, sendo excluído mais do que já era. Agora eu sou visto como deficiente. O meu acidente não foi uma fatalidade, mas escolha de alguém. É muito simples você fugir, dizer que não lembra, falar infelizmente. E eu, meu pai, minha mãe, meus sobrinhos que não tiveram tanto a oportunidade de brincar comigo?", declarou Jader Damasceno.

Para o jornalista, a principal dificuldade tem sido quebrar o preconceito das pessoas e mostrar a elas que sua condição não é limite para ninguém. Ele comentou que sua venda no olho, a muleta, as limitações na visão e fala assustam, mesmo quando não há intenção do outro em discriminar. Jader revelou ter saído de vários locais por conta de olhares estranhos dos demais.

"Não é fácil estar com limitação, pegar ônibus, andar de cadeira de rodas, atravessar no meio da rua, porque eu passei por tudo isso. Além da dificuldade de ambiente, inúmeros processos, tenho uma coisa que é muito importante: a dificuldade do olhar do outro. Eu tenho que matar um leão, uma matilha e um deles é o preconceito de estar como estou, porque existe muito a doce ilusão de que todo mundo te ajuda e isso não acontece", comentou.

O jovem revelou que depois do acidente deixou de ingerir bebida alcóolica por opção pessoal e percebeu que a decisão atraía mais as pessoas. Jader destacou que todos tem o direito de beber e dirigir, apesar de não ser correto, no entanto, as pessoas têm escolhas e necessidades, que podem gerar punições.

"Eu pergunto se tem necessidade de dirigir ou posso entregar a direção para alguém? Posso procurar outro meio de transporte? Você tem direito á escolha, mas também de ser punido. Um acidente de trânsito não é uma brincadeira de carrinho feito plástico, que você monta e desmonta, não é assim. É uma vida, não só de quem estava dirigindo, mas dos familiares, amigos, conhecidos, isto altera uma sociedade inteira. Seja menos egoísta!", declarou.

Emocionado, Jader Damasceno questionou quantas oportunidades serão ceifadas, pessoas vão se perder e terão as vidas alteradas por tragédias como a dele e dos amigos Bruno e Júnior. Para ele, o acidente retirou a chance de várias pessoas conhecerem os idealizadores do movimento Salve Rainha, os abraços do pai e os amigos, os amores deixados no caminho, os alunos que não aprenderam com os educadores culturais.

"As pessoas falam que pelo menos eu estou aqui para contar história. Não vejo vantagem de contar esta história, eu queria contar outra e até tento, mesmo com isso tudo que eu tenho passado, mas não é fácil. Graças a Deus eu consigo ver um sol em algum lugar no meio desta tempestade", disse.

 

Jornalista falou sobre superação e projetos para o futuro após o acidente (Foto: Catarina Costa/G1 PI)

Jornalista falou sobre superação e projetos para o futuro após o acidente (Foto: Catarina Costa/G1 PI)

Superação

Para enfrentar as dificuldades, Jader revelou ter escolhido lutar e fazer sempre uma autoavaliação, como ele define de 'resignificação'. O jornalista comentou que poderia ser o menino que chora ou que corre atrás, e decidiu ser a segunda opção, mesmo sendo mais dolorida. Ele conta que se sente mais inteiro com esta escolha por ficar bem com o próprio caráter.

"Eu digo para os amigos que sou um cristalzinho todo quebrado, mas eu vou lapidar de novo, em vez de juntar as migalhas, porque eu não quero ser mais o mesmo. O que tinha que ser foi até o dia do acidente, depois daquele dia, eu sou aquilo e mais alguma coisa, e amanhã serei outra pessoa. Espero fazer a diferença hoje, ajudar seja como discurso, arte, de outra forma ou só com minha cara e meu apoio", destacou Jader Damasceno.

Em uma fase de efervência de criação, segundo ele, Jader pretende montar um ateliê-agência para continuar com os seus projetos. Além disso, o jornalista vem organizando uma exposição, o lançamento de livro e outras ideias que ele não quis revelar.

"Tem uma área da moda que é a 'coateria', que significa desenvolver tendências antes que elas aconteçam. Eu gosto disso, brincar de criar com aquilo que não existe. Minha cabeça está cheia de ideias, tanto que eu não estou conseguindo dormir direito. Eu não quero o presente, mas o futuro", finalizou.

 

G1

Emanuel Vital

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